Pesquisador do PPGL-UFES redescobre quatro poemas traduzidos por Machado de Assis que permaneciam inéditos
O Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Espírito Santo acaba de disponibilizar em seu site a tese de doutorado Machado de Assis poeta-tradutor, defendida pelo Prof. Dr. Diego do Nascimento Rodrigues Flores em outubro deste ano. A pesquisa orientada pelo Prof. Dr. Raimundo Nonato Barbosa de Carvalho, sob coorientação do Prof. Dr. Eduardo Luis Araújo de Oliveira Batista, foi de alta produtividade: foram redescobertas quatro traduções poéticas de Machado de Assis que até agora não haviam sido coligidas pelos estudiosos da obra machadiana.
“O rei dos ôlmos (Balada de Goethe)”, assinada por Y. e atribuída a Machado, é uma tradução de “Erlkönig”, do poeta alemão Johann Wolfgang von Goethe, publicada na edição nº 241 da Semana Ilustrada, em 23 de julho de 1865. De acordo com Flores, o escritor brasileiro certamente não traduziu sozinho diretamente do alemão, visto que os seus estudos formais da língua de Goethe só começariam muito mais tarde, em 1883. Assim, só podemos supor com alguma segurança que esta tradução foi intermediada por alguém ou por outra tradução, possivelmente francesa.
A serenata “Lua da estiva noite”, composta em 1867 para ser cantada acompanhada de flauta e piano, com música do pianista Artur Napoleão, amigo de Machado de Assis, teve sua autoria atribuída exclusivamente ao poeta brasileiro, mas na verdade foi traduzida diretamente do poema “Serenade”, do norte-americano Henry Wadsworth Longfellow. Foi o professor José Américo Miranda que, após pedido de ajuda de Flores, conseguiu identificar o texto-fonte de Longfellow.
“O coração”, tradução do poema alemão “Das Herz” de Hermann Neumann, foi publicado anonimamente junto com texto-fonte na edição 782 da Semana Ilustrada, em 1875. Considerando que o poeta-tradutor ainda não conhecia o idioma alemão, provavelmente ele versificou o poema a partir de uma tradução literal do amigo Henrique Fleuiss, autor do desenho alegórico publicado junto com o poema.
Por fim, caso particularmente sui generis, “Inocência” de Luís Guimarães Júnior, também da década de 1870, foi vertida para o francês, constituindo o único trabalho em que Machado de Assis transporta um texto poético da língua portuguesa para uma língua estrangeira. Flores supõe que esta tradução foi um trabalho que o escritor fez a pedido de um amigo e que pouca relação guarda com a sua obra autoral ou sua poética.
De acordo com Diego Flores, a redescoberta das traduções poéticas, por muito tempo esquecidas, ajuda “a preencher a considerável lacuna deixada pela crítica quanto às traduções de Machado e ao papel que elas tiveram em sua carreira ou em sua obra”. Além disso, contribui para o conhecimento do escritor Machado de Assis a partir dos textos traduzidos por ele, buscando entender o que as escolhas feitas e o que os textos escolhidos representam para sua formação na maneira como dialogam com sua vida e obra e de que forma a maneira como foram traduzidos ajudam a perfilar o perfil do poeta-tradutor Machado de Assis.
A tese de doutorado Machado de Assis poeta-tradutor buscou estudar e perfilar, de maneira tão abrangente quanto possível, o poeta-tradutor Machado de Assis a partir dos poemas por ele traduzidos em confronto com os textos-fonte de que ele possa ter se servido. Adotando o viés metodológico de crítica de tradução proposto por Antoine Berman, Diego Flores estudou cada uma das traduções de poesia feitas por Machado de Assis, investigando os traços que poderiam nos ajudar a encontrar um projeto de tradução, um modus operandi machadiano do traduzir, revelando a marca do poeta-tradutor, obrigando-nos a ler esses poemas como novos originais que frequentemente dialogam com o restante de sua produção autoral e principalmente com sua visão de mundo e de literatura, além de terem sido instrumentais na sua formação como escritor.